Cuidado com a dor de cabeça no dia seguinte!
Sou economista, e bem sei da polêmica que esta profissão levanta nas piadinhas de salão.
Basta comparar as opiniões e análises de dois ou mais economistas para se concluir que nunca estão de acordo e chegam até a mais de uma conclusão sobre um único tema.
Pois bem, ainda sou obrigado a constatar que, nas outras profissões, o conhecimento sobre o tema chega a ser mais escasso.
Como exemplo, esperava-se, no início de outubro, um novo líder, uma espécie de super-homem que indicasse o caminho a seguir e evitasse o pior.
E logo apontaram para o primeiro-ministro britânico Gordon Brown, somente porque ele repisou o argumento assistencialista de que o governo precisa interferir, para o júbilo keynesiano e dos adeptos do intervencionismo.
Com mais critério e propriedade do que Bush, estabeleceu parâmetros e objetivos e implementou seu plano antes que os demais líderes mundiais chegassem a algum acordo (o governo Bush com o congresso, os governos europeus com seus parceiros da União Européia).
Sem dúvida que foi uma surpresa, principalmente partindo de governos e dirigentes de perfil conservador e adeptos do liberalismo econômico (ou neo-liberalismo, como os neo-dirigistas gostam de chamar).
O mais engraçado foram os comentários de repórteres e leitores sobre a figura (apagada?) e a aparência do primeiro-ministro. Parece que realmente esperavam um super-homem com a cara de Christopher Reeve ou outro ator de hollywood!
Com a ‘autoridade’ de economista formado pela FEA/USP e MBA internacional, recorro à figura da dona de casa como exemplo de economista competente:
Quando se nota que o dinheiro, a farinha, o feijão, etc. não serão suficientes, qual é a solução? Assaltar o cofrinho (desculpe o plágio, “colega” Mantega) da vovó e continuar a festa?
O razoável não seria, como toda dona de casa faz, economizar, reduzir os gastos de imediato e fazer cada um pagar a conta na medida de suas despesas e de suas possibilidades financeiras?
Tão simples.
Mas não! Isto é simples demais para os adeptos dos palanques ou da econometria.
Portanto, estatize-se bancos podres com o dinheiro da vovó (os impostos pagos pelo povo e os fundos dos pensionistas que pagaram a vida toda), aprove-se pacotes bilionários para 'salvar' instituições que foram fraudadas por oportunistas, para comprar ativos que nunca existiram ou títulos baseados em apostas...
Enfim, para não tratar a ferida, estamos tentando escondê-la com recursos 'alheios'.
Numa metáfora bem atual, temos quatro colegas de negócios que resolveram se esbaldar no restaurante mais caro da cidade. Como um deles esqueceu a carteira, o outro só tem cheque sem fundos, o terceiro um cartão bloqueado e o quarto está com o nome no SPC, na hora da conta um ficou olhando para o outro para ver quem paga. Constatada a situação unânime, resolveram que o certo seria usar o limite de crédito consignado da aposentadoria da mãe de um deles. É o que estamos vendo hoje. E ainda vai sobrar para os netos.
É como a proposta de “solução dos problemas de miséria do mundo” através do “perdão da dívida dos países pobres”, fórmula mágica preconizada pelo roqueiro Bono Vox. Prova que entende menos ainda de economia, e principalmente de ética: quem garante que após o perdão os mesmos reis, ditadores e demagogos desses países pobres não continuarão a roubar seus povos e pedir novos empréstimos? E é justo que paguem apenas os credores e poupadores dos países credores?
O bom senso nos leva à solução da dona de casa: não se consome mais nada e trata-se de pagar com os trocados que cada um tiver no bolso (o dono do restaurante vai ter que se conformar com a reposição apenas do custo dos insumos) e depois vamos lavar pratos.
Somente trabalhando com austeridade (e que quebrem os tais 'bancos de investimento' que intermediavam - mal – e ‘alavancavam’ os recursos dos verdadeiros bancos e dos investidores) e compartilhando o sacrifício (não aceitar mais o valor de face dos títulos mas ratear as perdas de acordo com os novos patamares de mercado) é que os agentes econômicos vão se adaptar à nova realidade e mais adiante retomar um crescimento realista e lento.
O que se propõe, atualmente, é que a vovó pague a conta e que continuemos a festa, pedindo uma farta sobremesa e licor, quem sabe até charutos cubanos...
Cuidado com a dor de cabeça no dia seguinte!
Roland Forster Corrêa